sábado, 22 de setembro de 2012

Foi

 O dia ia lento. O homem ia lento. As pessoas todas iam lentas. Iam lentos os carros, as pernas, as patas. Ia lento o relógio. O céu? Lento. As nuvens e o vento, lentíssimos. Iam também lentos os peitos, arfando lentamente. Lentas iam as lágrimas, pelas bochechas lentas. Iam lentos os olhos. Lentos também iam os ressentimentos. Ia lenta a vida.
 O dia ia cinza. O homem ia cinza. Iam cinzas as ruas. Os prédios também, cinzas. A fumaça? Cinza. Um punhado de cinzas se justificando no ar. As roupas todas cinzas, em conjunto com as sarjetas, as calçadas, os mendigos. Cinzas iam as crianças. As pedras iam cinzas, cinzas iam as esculturas. A chuva ia toda cinza. Ia cinza a vida.
 O dia ia morto. O homem ia morto. Iam mortas as flores. Iam mortas as velas, as rezas, os crucifixos. Ia morto o passo. O cortejo? Morto. Os lamento e pesares, motíssimos  Ia morta a pá e o coveiro, as lápides e os canteiros. Iam mortas as palavras. Se haviam sorrisos pode-se dizer que iam mortos. Iam mortas as almas e os corpos, que se sustentavam vivos só para verem uns aos outros indo mortos. Os sussurros iam mortos. O silêncio ia morto e mortas iam as saudades. Ia assim a vida.

Um comentário:

  1. Muito cinza, muitas cinzas. Como restos mortais.

    Excelente, Giovana. Gosto quando consigo me ver nas palavras de outro alguém.

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