sábado, 13 de agosto de 2011

A Não Opinião Pública

   A Opinião Pública andava descontraidamente por aí, sem pressa, sem compromisso. Passava muito bem, obrigada. Estava sempre nas ruas, nos bares, nas lojas. Fazia uma pontinha na prefeitura, passava por lá às vezes cantarolando, feliz da vida, cumprimentando os trabalhadores, dando uma olhada nas reuniões, rindo-se do cansaço no fim da tarde. Gostava muito de um bom chopp com os amigos nas sextas e de sair para as  festas nos sábados. Chegava tarde em casa, quase não dormia. Solicitada sempre e sempre solícita, era companheira, nunca deixava ninguém na mão. Começou a ficar famosa. Era chamada pra palestras, discursos e mutirões. Ia a passeatas, reivindicava direitos e tentava cumprir obrigações. Fazia tudo pra ser ouvida, inclusive escândalo.
   Quando começou a fazer escândalo resolveram boicotar a Opinião Pública. Botaram-na pra baixo, a coitada. Fazia um esforço, mas já estava por fora, ninguém mais queria ouvir a pobre. Pobre Opinião Pública. Passava vexame ao tentar falar, lhe davam as costas ou não lhe davam nada. Foi despedida, não ia mais à prefeitura. Faltava aos chopes, às baladas. Sumiu da rede mundial de computadores, da rede internacional de comércio e da rede no quintal do vizinho. Não queriam mais saber dela. Se acaso era chamada para um desabafo amigo acenava com a cabeça como quem já está abafada demais e não ajudava de nada.
   Trancou-se em casa a Opinião Pública. Ninguém sabia onde andava. Às vezes diziam que a tinham visto numa numa rua, beco, boteco ou bordel mas logo sumiu de vez. Passou a ser chamada Não Opinião Pública, por que já não era nada. Dizem que anda noites por aí, embebedando-se, conversando sozinha em voz alta de frente ao espelho ou ao copo meio vazio, meio cheio. Não se dá mais ouvidos a Opinião Pública. Nem ela mesma escuta o que diz, se é que diz algo. Parece que se calou a infeliz ou desaprendeu a falar, quem sabe.

quarta-feira, 10 de agosto de 2011

Telefonema

Diálogo 1


- Alô?
- Alô, quem gostaria?
- Gostaria de quê, especificamente?
- Quem gostaria de falar, ué!
- Ah isso como eu vou saber? Acho que quem não aprendeu a falar que gostaria, você não?
- Pare de brincadeiras amigo e diga logo quem fala!
- Todo mundo fala. Bom, a maior parte.
- Mas quem é que está falando?
- Milhões de pessoas veja só! Inclusive nós dois, ora bolas..
- Pare já! Diga quem é aí do outro lado falando comigo!
- Ah, aqui sou eu.
- Quem seria "eu"?
- Como é que eu vou saber, se nem o colega sabe? Diga você quem é..
- Mas foi você quem ligou pra cá! Você é quem deve dizer!
- Mas eu não conheço você. Nem sei se é com você que devo falar.
- E como se chama a pessoa com que o senhor deve falar?
- Tem por nome Carlos. Seria o colega, ou um conhecido?
- Não, aqui não tem nenhum Carlos!
- Então o amigo desculpa, que foi engano. Tchau.