Para Ivan Calaça
Nos trigésimos andares
As almas, pilares
Dos crânios sobrepostos
Em capas, aposto
Nas vozes compridas
Cumpridas, detidas
Pela chuva caindo
Subindo, subindo
Desde o Tietê
(Vai você, vai você!)
Salvar a trouxa de roupas
Tão soltas, tão frouxas
Flutuando nas poças
Tão fundas, tão nossas
Com os pés chapinhando
Gemendo, cantando
Uma ópera fria
Cansada, vazia
No vazio desses quartos
Entulho, pedaços
Da madeira do teto
Tijolo, concreto
Sobre as pernas e os braços
Esboços, fracassos
Da cidade inteira
Marginal e ladeira
Sofrimento do mundo
(Tão fundo, tão fundo...)
Como monstros ilhados
Janelas, telhados
E o tudo nadando
Sofrendo, boiando
E pedindo socorro
(O morro! O morro!)
Devagar desabando
E mexendo, pesando
Nem se chega ao final
Se dá mal, se dá mal
Só sofre de enchente
(E a gente? E é gente?)
Nessa chuva levada
Vai ingrata, errada
Que despreza a seca
Lá foge, não chega
E aqui é um sufoco
Tanto só pra um pouco
Com água até o pescoço
(De novo, de novo...)
A escalar toda vida
Sem ajuda, subida
E não há quem socorre
Nem nasce, já morre
Como quem não resmunga
Nem respira, afunda
Insanamento básico
Em descaso apático
Se esgueirando de lado
Nesse mundo encharcado
Pra morrer em segredo
Ensopado, mas seco.