Estava reclamando. E nem sabia pelo que o fazia. Só sabia que reclamava, em altos brados que ecoavam dentro da cabeça, ricocheteando nas paredes do crânio, ultrapassando a massa cinzenta e repousando nos ouvidos alheios. E vivia assim, no meio de palavras declamadas pra que se reclamasse algo. Mas as reclamações não eram próprias. Eram de todos, eram alheias e públicas, não sumiam nunca, não deixavam de existir e nem deixam. As reclamações se espalham e prevalecem. Resistem ao tempo e ficam velhas, velhas, quase caducas, mas ninguém nunca as deixa de lado. As reclamações fingem que se dissolvem, num pique esconde onde ninguém quer procurar mas sempre acha, involuntariamente. O mundo reclama. É sobre isso, aquilo, aquele, esse e o outro, sempre e sobre tudo, num infinito descontentamento quase prazeroso que permite, além de aliviar frustrações, irritar o outro, fazendo com que ele agora passe a reclamar frustrado. Assim as reclamações passam a durar pra sempre, num contrato duradouro com o infinito, sem que se possa exterminá-las. E quando não se reclama? Alguém pode estar se perguntando. Ora quando não se reclama se está fazendo a maior reclamação possível. A reclamação pelo direito de viver, leve e tranquilamente, deixando que apenas o resto do mundo se preocupe em reclamar. Aliás, a reclamação também pode ser útil e vem ao socorro quando é preciso. Podem-se reclamar direitos, deveres, dinheiro ou qualquer outra bobagem que alguém julgue preciso reclamar. Mas às vezes, numa direção de “quase sempre”, o reclame se torna cansativo e entediante depois de um tempo, e as reclamações voltam à sua inércia, em sua origem e natureza de frustração quase proposital. Mas continua reclamando. E não sabe e nem dá a mínima em saber o porquê. Só sabe que brada alto, com outros reclamantes que se juntam num protesto contra algo que não se incomoda em se incomodar. Até quando?
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