sábado, 3 de março de 2012

O ônibus

  Conheci um ônibus. Fui ao seu encontro e o descobri. Escalei seus degraus e o desvendei. Ele se abriu pra mim. De dentro pra fora, como deve ser, com lentidão e paciência (minha, é claro). Conheci um ônibus. Conheci seu condutor simpático e tímido. Conheci sua estrutura monumental que pode ser vista por todos, mas nunca fica parada em um só lugar. Conheci suas janelas, seu chão, sua vaidade. Conheci seu sócio, aquele que tira dinheiro de seus apreciadores, carrancudo e mal humorado, ou apenas cansado de guerra. Conheci suas poltronas, seu chão e seu teto. Conheci seus habitantes temporários, seus inquilinos relâmpago.
   Conheci a dona de casa cansada, com suas compras insuficientes para sua abundancia familiar, mas com um esforço suficientemente abundante. Conheci o rapaz esforçado, com seus livros pesados e sua barba por fazer, os olhos cerrados, as olheiras presentes e a cabeça alheia ao movimento de encontro ao vidro. Conheci as garotas jovens, com vontade de viver e com vida, com os sorrisos de piada interna e com anedotas externas não tão sorridentes. Conheci o casal idoso, com seu amor indelével, com suas caricias reprimidas e com sua implicância contida no tempo. 
   Conheci os garotos unidos, com qualquer lugar pra ir, com qualquer vontade nos olhos, sem qualquer peso nas costas. Conheci o homem atrasado, acomodado de rosto, frustrado de alma, esperando o momento certo pra implodir sua impaciência, já que explodi-la causaria grandes vexames. Conheci as trabalhadoras sonolentas, com necessidade de movimento mesmo que interno, com as esperanças invisíveis externamente. Conheci também outro descobridor de ônibus, assim como eu, com os olhos decifrando faces até encontrarem a minha e sorrindo para ela sem mover os lábios.
   E por fim conheci a rua. Vi-a passando pela janela, mas queria conhecê-la de perto, então me despedi do ônibus, já velho conhecido. As portas com problema mecânico faziam menção de me pedir pra ficar, mas eu estava só de passagem.

2 comentários:

  1. Adoro o jeito como você escreve, Giovana. Palavras lindas e muito bem encaixadas formando um texto tão carismático e aprazível de se ler.

    Mas o único defeito que encontrei no blog são os grandes intervalos entre os posts. Se eu pudesse dar um pitaco, diria para que postasse mais e mais. O público clama por isso.

    Uns abraços.

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